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Crianças são semeadas
São sêmen-tes plantadas,
No seio materno da existência
Brotam-se da água, da natureza
Do amniótico liquido prover.
Inauguram-se na vida...
Com a missão, à obrigação factual,
De ser o elo da própria continuidade
Em sua carente fragilidade
Precisa do abraço terno, provedor
A lhe criar raízes e através delas
A crescer, se desenvolver,
Se fortificar, se tornar arvore
De boa sombra frutífera
Mas nesse mundo injusto e cruel
São lançadas a própria sorte...
Aos ventos do acaso, a sofrer na pele
O estado vergonhoso da miséria e injustiças,
Do brutal desumano, que lhes rejeitam.
São filhos da fome, da solidão
Dos medos, da injusta miséria,
Habitam sob as marquises,
Sobrevivem dos semáforos,
Alimentam-se de líquidos solventes
Desmoronam-se na fumarada dos craques
São marcadas na alma,
Pelos açoites das tragédias
E se perguntam o por quê...
Vão ao abandono abrir feridas
Pútridas dos sentimentos, da não resposta
Que com o tempo, criam crostas, arestas...
Que viram espinhos, cacos de vidros,
Estiletes, revólveres, armas de dois gumes,
A ferir, matar e ou morrer.
São troféus gerados das desilusões
Do moldado caráter, pelos infortúnios.
Condenam-se à convicção do instinto
De perder a cruel lucidez
Toxicada, alucinada, no torpor
De suas carências e revoltas
Pelas feridas que sangram
...A ingratidão da vida.
Lufague.
CRÔNICA AO POEMA CRIANÇAS DO ABANDONO (Por Silvia Mendonça)
"Crescei-vos e multiplicai-vos", "Vinde a mim as criancinhas, pois delas é o Reino do Céu". Propaganda enganosa? Estas seriam diretrizes para o mundo perfeito para o qual fomos criados. Só que esse mundo, esse Éden, paraíso, como queiram chamar, deixou de existir. O mundo em que vivemos é esse que descreves, Lu: um mundo de abandono, de carência, de tristeza, de crueldade, drogas; legado àqueles que deveríamos manter longe de tudo isso: nossas crianças!
"Inauguram-se na vida...
Com a missão, à obrigação factual,
De ser o elo da própria continuidade"
O que temos a lhes oferecer? Semáforos, marquises, fome, miséria, vergonha, humilhação, abuso, solidão, tragédias, drogas, abandono... É a essa continuidade que as crianças "inauguram-se na vida"? "Eduque a criança de hoje e não precisará punir o homem de amanhã", diz o Pitágoras. O que estamos fazendo nesse sentido? Quais são as políticas públicas voltadas para a formação dos cidadãos de amanhã? No cenário da fome dos empobrecidos, contrastando com a opulência de uma elite paradisíaca (a má distribuição da riqueza), a violência se fez prosperar, enquanto o ser humano, seu principal ator, passou a ser impulsionado para o materialismo e falta de limites, onde o que vale é gozar a vida - mas a vida tem pouco valor nos dias atuais.
É importante asseverar que o Estado tem a obrigação, prioritariamente a qualquer outra, de organizar e manter, com recursos materiais e humanos, programas sociais, objetivando assegurar à criança e ao adolescente os direitos constantes do artigo 227 da Constituição Federal: “É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda a forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão”.
Podemos, pois, exigir de nossos governantes a destinação prioritária de recursos públicos para programas, voltados à proteção e ao desenvolvimento de nossas crianças e adolescentes. Os direitos que o Estado tem que lhes garantir começam desde a concepção, pois é essencial uma gestação saudável, que lhes irá proporcionar, no nascer, boas condições de saúde física e mental. Os cuidados que as devem cercar, na primeira infância, é condição para que, já no ensino fundamental, ou antes mesmo, na educação infantil, seja na creche ou na pré-escola, tenham elas tratamento prioritário, em igualdade de condições com todas as demais, independentemente do berço, para o iniciar de sua educação.
É relevante que se diga, Lu (e tu o sabes), que é na primeira infância o estágio mais fundamental do desenvolvimento psíquico, físico e motor da criança. Nela, é que a sua inteligência pode atingir os pontos máximos. Nela, o amor e o carinho são celeiros que nutrirão, pela vida toda, a afetividade do pequeno cidadão. É necessário, pois, conscientizar a população destes direitos e deveres, já que irão garantir o verdadeiro sentido do princípio constitucional da igualdade de todos perante a lei, priorizando recursos para o desenvolvimento da criança, preparando-a para o pleno exercício de sua cidadania. Temos que exigir programas sociais que tenham a função de proteção e cuidados devidos à gestante. Inclusive, há que se educar a adolescente, e discutir, com a comunidade, a gestação precoce.
Não devem ser esquecidas as políticas públicas de atendimento aos riscos maiores da criança, ou seja, a violência física, mental ou sexual; o abandono, os maus tratos - e o nefasto trabalho infantil. Imperativo se torna exigirmos melhorias significativas na atuação governamental na educação, cultura, música, esportes, seja no ensino fundamental, seja no ensino médio.
Podemos pressionar nossas autoridades para o aprofundamento do combate à disseminação das drogas e das doenças sexualmente transmissíveis. A atuação da família no contexto do desenvolvimento físico e mental das crianças e dos adolescentes é fundamental para seu equilíbrio emocional. Especial atenção devem ser dadas à desnutrição, à obesidade infantil, à saúde bucal, ao déficit de atenção e tantos outros pontos relevantes para o normal desenvolvimento de todas as crianças.
Finalmente, é de se lembrar o aspecto espiritual, que se sobrepõe ao material. O bom exemplo, o carinho, o amor e a fé, no seio da família e da comunidade, constroem o sustentáculo moral e sentimental da criança, onde, com Deus em seu coração, ela vai se encontrar com a fraternidade, com os valores humanitários, com a dignidade, com honra, a honestidade e tantas outras virtudes que a nortearão por toda a sua vida.
Silvia Mendonça